Prezados
amigos,
Salve
Maria!
Enquanto
o Papa Francisco propugna uma misericórdia infinita e irrestrita, Santo Afonso,
com base nas Sagradas Escrituras, no Sagrado Magistério e na Tradição da Igreja
adverte o pecador da finitude dos atos de comiseração de Deus para com o
pecador. Ressalto que Santo Afonso Maria de Ligório foi posto no rol dos Doutores da Igreja pelo Papa Pio IX, demonstrando,
desta forma, que nenhum erro doutrinário foi encontrado em suas obras. Boa
leitura!
CONSIDERAÇÃO XVII
Abuso da
divina misericórdia
Ignoras quoniam
benignitas Dei ad poenitentiam te adducit?
Não sabes que a
benignidade de Deus te convida à penitência? (Rm 2,4)
PONTO I
Lê-se
na parábola do joio que, tendo crescido num campo essa má erva juntamente com a
boa semente, os servos quiseram arrancá-la (Mt 13,29). O Senhor, porém, lhes
objetou: “Deixai-a crescer; mais tarde a arrancaremos para lançá-la ao fogo”
(Mt 13,30). Infere-se desta parábola, por um lado, a paciência de Deus para com
os pecadores, e por outro o seu rigor para com os obstinados. Diz Santo
Agostinho que o demônio seduz os homens
por duas maneiras: “Com desespero e com esperança”. Depois que o pecador
cometeu o delito, arrasta-o ao desespero pelo temor da justiça divina; mas,
antes de pecar, excita-o a cair em tentação pela esperança na divina
misericórdia. É por isso que o Santo nos adverte, dizendo: “Depois do pecado
tenha esperança na divina misericórdia; antes do pecado tema a justiça divina”.
E assim é, com efeito. Porque não merece a misericórdia de Deus aquele que se
serve da mesma para ofendê-lo. A misericórdia é para quem teme a Deus e não
para o que dela se serve com o propósito de não temê-lo.
Aquele
que ofende a justiça — diz o Abulense — pode recorrer à misericórdia; mas a
quem pode recorrer o que ofende a própria misericórdia? Será difícil encontrar
um pecador a tal ponto desesperado que queira expressamente condenar-se. Os
pecadores querem pecar, mas sem perder a esperança da salvação. Pecam e dizem: Deus é a própria bondade;
mesmo que agora peque, mais tarde confessar-me-ei. Assim pensam os pecadores,
diz Santo Agostinho. Mas, meu Deus, assim pensaram muitos que já estão
condenados.
“Não digas — exclama o Senhor — a misericórdia de Deus é grande: meus
inumeráveis pecados me serão perdoados com um ato de contrição” (Ecl 5,6).
Não faleis assim — nos diz o Senhor — e por quê? “Porque sua ira está tão
pronta como sua misericórdia; e sua cólera fita os pecadores” (Ecl 5,7). A misericórdia de Deus é infinita; mas os
atos dela, ou seja, os de comiseração, são finitos. Deus é clemente, mas
também é justo. “Sou justo e
misericordioso — disse o Senhor a Santa Brígida — e os pecadores só pensam na misericórdia”. Os pecadores —
escreve São Basílio — só querem considerar a metade. “O Senhor é bom; mas
também é justo. Não queiramos considerar unicamente uma das faces de Deus”.
Tolerar quem se serve da bondade de Deus para mais o ofender — dizia o Padre
Ávila — fora antes injustiça que misericórdia.
A clemência foi prometida a quem teme a
Deus e não a quem abusa dela. Et misericordia ejus timentibus eum, como
exclama em seu Cântico a Virgem Santíssima. A justiça ameaça os obstinados,
porque, como diz Santo Agostinho, a veracidade de Deus resplandece mesmo em
suas ameaças.
Acautelai-vos — diz São João Crisóstomo — quando o demônio (não Deus) vos promete
a misericórdia divina com o fim de que pequeis.
Ai
daquele — acrescenta Santo Agostinho — que para pecar confia na esperança!... A
quantos essa vã ilusão tem enganado e levado à perdição.
Desgraçado
daquele que abusa da bondade de Deus para ofendê-lo mais!... Lúcifer — como afirma São Bernardo — foi castigado por Deus com tão
assombrosa presteza, porque, ao rebelar-se, esperava
não ser punido. O rei Manassés pecou; converteu-se em seguida, e
Deus lhe perdoou. Mas para Amon, seu filho, que, vendo quão facilmente seu pai
havia conseguido o perdão, entregou-se à má vida com a esperança de também ser
perdoado, não houve misericórdia. Por essa causa — diz São João Crisóstomo —
Judas se condenou, porque se atreveu a pecar confiando na clemência de Jesus
Cristo. Em suma: se Deus espera com
paciência, não espera sempre. Pois, se o Senhor sempre nos tolerasse,
ninguém se condenaria; ora, é larga a porta e espaçoso o caminho que leva à
perdição, e muitos são os que entram por ele (Mt 7,13). Quem ofende a Deus,
fiado na esperança de ser perdoado, “é um escarnecedor e não um penitente”, diz
Santo Agostinho.
Por
outra parte, afirma São Paulo que de “Deus não se pode zombar” (Gl 6,7). E
seria zombar de Deus o querer ofendê-lo sempre que quiséssemos e desejar, a
seguir, o paraíso. Quem semeia pecados,
não pode esperar outra coisa que o eterno castigo no inferno (Gl 6,8). O
laço com que o demônio arrasta quase todos os cristãos que se condenam é, sem
dúvida, esse engano com que os seduz, dizendo-lhes: “Pecai livremente, porque,
apesar de todos os pecados, haveis de salvar-vos”.
O
Senhor, porém, amaldiçoa aquele que peca na esperança de perdão.
A
esperança depois do pecado, quando o pecador deveras se arrepende, é agradável
a Deus, mas a dos obstinados lhe é abominável.
Tal
esperança provoca o castigo de Deus, assim como seria passível de punição o
servo que ofendesse a seu patrão, precisamente porque é bondoso e amável.